De volta pra casa

Era madrugada e eu escapava de uma casa enorme. Um homem esguio e sombrio me perseguia. Enquanto me escondi entre o arbusto florido, eu a vi. Velha, gorda e carregando galhos esquisitos nas costas. Ela disse que não me preocupasse, pois tudo ia ficar bem. Então eu acordei. Esse foi meu primeiro contato com La Loba. E eu ainda nem tinha lido Mulheres que correm com os lobos (da Clarissa Pinkola Estés).

Meses antes, eu sofri um ataque de pânico. Acreditava que, se dormisse, morreria. Demorei horas para me acalmar, entregando-me ao desconhecido no chão da sala da minha mãe. Tomei um mês de calmante tarja preta e voltei a dormir. Mas a verdade é que, assim como muitas mulheres, tinha me tornado um fantasma de mim mesma.

(Sobre)Vivia a rotina louca que São Paulo impõe, tinha me formado em um curso que não gostava, não conseguia me encontrar em nada. Principalmente porque não tinha tempo para essa busca. Até que um dia eu mudei de emprego e comecei a praticar yôga ao lado do local de trabalho. Foi então que comecei a sentir que estava começando a entrar em contato comigo mesma. E aí que La Loba apareceu.

Logo em seguida – ainda sem ler o livro -, sonhei com o conto da mulher esqueleto e do barba azul (depois, em terapia, descobri ser meu companheiro na época e que me deu um chave com um barbante azul em nosso término). Era isso. Além da yôga, eu precisava de terapia. Tinha necessidade em explodir tudo o que estava de errado, escavar até as entranhas para limpar e, então, começar de novo.

Eu não deveria ter esperado tanto tempo para entrar em contato comigo. Mas, assim como tantas mulheres, esqueci como se dançava e deixei todos os outros, cada qual com seu interesse particular, me conduzirem. Hoje eu ainda não sei bailar bem. Só que não tenho mais medo de arriscar os passos. E quando tudo que não é meu ameaça me atingir, eu olho pra lua, abraço uma árvore, coloco os pés na terra, limpo minhas coisas. E vejo que meu coração está lá. Batendo seu vermelho vivo, emanando uma luz dourada, forte e frágil dentro de um carvalho.


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